Atrofia hemifacial progressiva: Relato de caso

MEDICINA Y PATOLOGÍA ORAL

Atrofia hemifacial progressiva Relato de caso

Thiago Pastor da Silva Pinheiro 1, Camila Camarinha da Silva 2, Carolina Souza Limeira da Silveira 2,
Patrícia Cristina Ereno Botelho 3, Maria das Graças Rodrigues Pinheiro 4, João de Jesus Viana Pinheiro 5

(1) DDS, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Centro Universitário do Pará
(2) Estudante do Departamento de Patologia Oral, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Pará
(3) DDS, Ortodontista
(4) MS, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Centro Universitário do Pará
(5) Doutorado, Hospital Universitário João de Barros Barreto, Departamento de Patologia Oral,
Escola de Odontologia da Universidade Federal do Pará

Correspondência

ABSTRACT

Atrofia Hemifacial Progressiva, também conhecida como Síndrome de Parry-Romberg, é uma condição degenerativa incomum e mal compreendida. Caracteriza-se por uma atrofia lenta e progressiva que afecta um dos lados da face. A incidência e a causa desta alteração é desconhecida. Um distúrbio cerebral do metabolismo da gordura tem sido proposto como causa primária. Isto pode ser o resultado de uma malformação trófica do Sistema Nervoso Simpático Cervical. Possíveis fatores que estão envolvidos na patogênese incluem trauma, infecções virais, hereditariedade, distúrbios endócrinos e auto-imunidade, entre outros. As complicações mais comuns que aparecem associadas a este distúrbio de saúde são: neurite do trigêmeo, parestesia facial, dor de cabeça grave e epilepsia, sendo esta última a complicação mais freqüente do Sistema Nervoso Central. Caracteristicamente, a atrofia progride lentamente durante vários anos e, logo após, torna-se estável. Agora, a cirurgia plástica com enxerto de gordura autógena pode ser realizada, após a estabilização da doença, para corrigir a deformidade. O tratamento ortodôntico pode ajudar na correção de qualquer malformação associada. O objetivo deste trabalho é, através da apresentação de um caso clínico, realizar uma revisão bibliográfica sobre características gerais, etiologia, fisiopatologia, diagnóstico diferencial e tratamento da atrofia hemifacial progressiva.

Key words: Atrofia Hemifacial, síndrome de Parry-Romberg, fisiopatologia, tratamento.

Introdução

Atrofia Hemifacial Progressiva, também conhecida como Síndrome de Parry-Romberg, é uma condição degenerativa incomum, caracterizada por uma atrofia lenta e progressiva, geralmente unilateral, dos tecidos faciais, incluindo músculos, ossos e pele (1, 2). Mais do que um problema estético, esta doença traz vários problemas funcionais e psicológicos, quando uma face “simétrica” perde a sua identidade. A incidência e causa desta alteração é desconhecida. Um distúrbio cerebral no metabolismo da gordura foi proposto como causa primária (3, 4). Acredita-se que traumas, infecções virais, distúrbios endócrinos, auto-imunidade e hereditariedade estejam associados à patogênese da doença (5-9).

Frequentemente, o aparecimento desta síndrome ocorre ao longo da primeira e segunda décadas de vida. Caracteristicamente, a atrofia progride lentamente durante muitos anos e, depois, torna-se estável (5, 10-12). Alterações no envolvimento, duração e deformidade podem se estabilizar em qualquer estágio de crescimento e desenvolvimento (2, 5). Pacientes que manifestam atrofia em idades precoces, têm maiores repercussões (11).

Esta síndrome parece ter maior incidência em mulheres (1, 3, 7). A extensão da atrofia é frequentemente limitada a um lado da face e o envolvimento ipsilateral do corpo é raro (2). 5% a 10% dos casos foram descritos como sendo bilaterais (6).

As características mais importantes dessa patologia são a enoftalmia, o desvio da boca e do nariz para o lado afetado e a exposição unilateral dos dentes (quando lábios estão envolvidos) (7), entre outras.

A Síndrome de Parry-Romberg é uma condição auto-limitável e não há cura. Os pacientes afetados devem ter atendimento multidisciplinar de médicos, dentistas, fonoaudiólogos e psicólogos. O tratamento foi desenvolvido tentando dar uma melhor aparência aos portadores desta síndrome. Atualmente, cirurgias cosméticas com enxerto de gordura autógena, injeções de silicone ou colágeno bovino e implantes inorgânicos são algumas alternativas para corrigir deformidades (13). Além da melhora estética, está indicado o tratamento sintomático para distúrbios neurológicos (9).

Casso Relato de Caso

Em 2001, uma paciente de 8 anos de idade, residente em Belém do Pará, foi conduzida na clínica radiológica de documentação ortodôntica. Durante o exame físico, observou-se que essa paciente apresentava assimetria facial com marcada hipoplasia do lado direito da face, com desvio de lábios e nariz, com grande cicatriz linear escura (golpe de sabre) no lado direito da região do mentum mandibular, enofthalmy na região do olho direito e áreas de hiperpigmentação na pele acometida. Intraoralmente, a alteração mais relevante foi a atrofia unilateral da língua (Figura 1). Radiograficamente, observou-se um desenvolvimento radicular atrófico ou uma reabsorção patológica dos dentes permanentes números 34, 33, 41, 42, 43, 44, 45, 46 e 47 (Figura 2).

O paciente apresentou bom estado de saúde, sem qualquer doença que explicasse a causa dessa assimetria facial. Foram solicitadas fotos de anos anteriores ao responsável pelo paciente, que as forneceu desde o 1º até o 8º ano de idade. Os sinais clínicos do distúrbio só foram percebidos a partir do 6º ano de vida (Figura 3 A, B, C).

Com estes achados clínicos e radiológicos, o diagnóstico foi de atrofia hemifacial progressiva. Atualmente, o paciente está sendo revisto periodicamente até que a manifestação atrófica pare e uma intervenção específica possa ser realizada.

Em 2003, aos 10 anos de idade, uma nova documentação fotográfica e radiográfica foi feita com o objetivo de analisar a evolução do caso. Extraoralmente, houve um agravamento dos sinais clínicos observados há dois anos, como enofthalmy, hipoplasia da hemiface direita, com desvio de lábios e nariz, e também hiperpigmentação cutânea. Durante um exame intrabucal, observou-se a persistência do canino e dos primeiros dentes decíduos molares, assim como o apinhamento dentário. Radiograficamente, foi observada uma imagem sugestiva de reabsorção radicular patológica dos dentes número 14, 15, 16, 17, 41, 42, 43, 44, 45, 46 e 47, assim como o impacto do elemento 45 por 84 e do elemento 47 por 48 (dente em desenvolvimento).

Discussão

A atrofia hemifacial progressiva, como descrito no caso acima, é uma patologia rara, de causa desconhecida, cuja condição degenerativa afeta não só a estética, mas também a funcionalidade da hemiface atingida.

Clinicamente, a pele pode estar seca e com uma pigmentação escura. Alguns pacientes apresentam uma linha de demarcação entre pele normal e anormal, lembrando uma grande cicatriz linear, conhecida como golpe de sabre, como pudemos notar no caso relatado. O envolvimento ocular é comum e a manifestação mais freqüente é a enofthalmy, devido à perda de gordura ao redor da órbita, como foi observado em nosso paciente. O olho normalmente funciona normalmente. Mesmo não sendo notado no presente caso, o ouvido pode ser menor que o normal devido à atrofia (5). Pode haver áreas localizadas de alopecia. Ocasionalmente, pode haver algumas complicações neurológicas, como neuralgia do trigêmeo, parestesia facial, cefaléia grave e epilepsia contralateral (1, 11, 14-16), sendo esta última a complicação mais comum (17). A boca e o nariz são desviados para o lado afetado, desviando também as linhas médias faciais e dentárias. Atrofia do lábio superior levou os dentes anteriores a serem expostos, podendo haver também atrofia unilateral da língua. Nosso caso mostrou claramente aquelas características de assimetria facial e atrofia da língua. Radiograficamente, os dentes do lado afetado podem apresentar alguma deficiência no desenvolvimento radicular e, consequentemente, retardar a erupção. Entretanto, os dentes afetados são normais e vitais clinicamente. Essa situação ocorreu com a nossa paciente, pois a maioria dos dentes do lado afetado apresentava reabsorção/malformação das raízes, causando atraso na erupção e apinhamento dentário. Muitas vezes, há mordida cruzada posterior unilateral, como resultado da hipoplasia maxilar e da erupção retardada dos dentes (4, 10). Os tecidos moles intrabucais e os músculos mastigatórios são, por vezes, normais, sem quaisquer implicações de movimento, fala ou deglutição (5, 7). Histologicamente, observa-se atrofia da epiderme, derme e tecido subcutâneo (7). Infiltrado variável de linfócitos e monócitos na derme (11, 7) e falta de gordura subcutânea no tecido afetado também são característicos (7). Além disso, podem ser identificadas alterações degenerativas nos endotélios vasculares em microscopia eletrônica (7).

O tratamento é geralmente baseado na reposição do tecido adiposo que foi perdido devido à atrofia (12). Enxertos de gordura autógena, enxertos de cartilagem, injeções e próteses de silicone, colágeno bovino e implantes inorgânicos são algumas alternativas à correção estética da atrofia (12, 13). Entretanto, essas modalidades de tratamento resolvem momentaneamente a boa aparência, enquanto toda a estrutura projetada na cirurgia estética se perde com o tempo, devido à ação da gravidade, e o paciente necessita de uma nova intervenção. Além disso, um tratamento de suporte é indicado para problemas funcionais e neurológicos. O tratamento cosmético é apenas recomendado quando a doença interrompe a sua evolução, sendo esta a razão pela qual o nosso paciente ainda não foi submetido a qualquer intervenção cirúrgica.

O diagnóstico precoce é relevante, principalmente nos casos de doenças sistêmicas de origem idiopática, nos quais uma simples anamnese e um exame clínico convencional não fornecem dados suficientes para um diagnóstico preciso e um tratamento adequado.

1. Jurkiewicz MJ, Nahai F. O uso de enxertos revascularizados livres na melhora da atrofia hemifacial. Plast Reconstr Surg 1985;76:44-55.

2. Lakhani PK, David TJ. Atrofia hemifacial progressiva com esclerodermia e desgaste ipsilateral de membros (Síndrome de Parry Romberg). J R Soc Med 1984;77:138-9.

3. Finesilver B, Rosow HN. Hemiatrofia total. JAMA 1938;5:366-8.

4. Foster TD. Os efeitos da atrofia hemifacial do crescimento dentário. Br Dent J 1979;146:148-50.

5. Mazzeo N, Fisher JG, Mayer MH, Mathieu GP, Mcade FGG. Atrofia hemifacial progressiva (Síndrome de Parry Romberg). Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 1995;79:30-5.

7. Pensler JM, Murphy GF, Muliken JB. Estudos clínicos e ultra-estruturais da atrofia hemifacial de Romberg. Plast Reconstr Surg 1990;85:669-76.

8. Shaffer WG, Hine MK, Levy BM, eds. Textbook of oral pathology. Philadelphia: WB Saunders; 1983. p. 9-10.

9. Zafarulla MY. Progressive hemifacial atrophy: a case report. Br J Ophthalmol 1985;69:545-7.

12. Roddi R, Riggio E, Gilbert PM, Houvius SER, Vaandrager JM, van der Meulen JCH. Avaliação clínica das técnicas utilizadas no tratamento cirúrgico da atrofia hemifacial progressiva. J Craniomaxilofac Surg 1994;22:23-32.

13. de la Fuente A, Jimenez A. Latissimus dorsi free flap for restauration of facial contour defects. Ann Plast Surg 1989;22:1-8.

14. Gorlin RJ, Pinborg JJ, eds. Sindromes da cabeça e pescoço. New York: McGraw Hill; 1964. p. 475 7.

15. Roed-Petersen B. Relatório de lipodistrofia hemifacial de um caso. Oral Surg Oral Med Oral Pathol 1979;43:230-2.

16. Sagild JC, Alving J. Enxaqueca hemiplégica e atrofia hemifacial progressiva. Ann Neurol 1985;17:620.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.